Relembre Zélia Gattai
Postado em 17 DE maio DE 2012
Despedida
Sobre nossa casa, de Jorge e minha, na rua Alagoinhas, 33, no bairro do Rio Vermelho, em Salvador da Bahia, muito já se disse, muito se cantou. Citada em prosa e verso, sobra-me, no entanto, ainda o que dela falar.
Fico pensando se alcançarei escrever todas as histórias, tantas, de gente e de bichos que nela passaram nesses quarenta anos lá vividos.
Neste momento, quando me despeço do lugar onde passei o melhor tempo de minha vida, ao deixar Jorge repousando sob a mangueira por nós plantada no jardim, mil lembranças afloram-me à cabeça. Lembro-me de coisas que para muitos podem parecer tolas, mas que para mim não são.
Lembro-me, por exemplo, de duas mimosas lagartixas que viviam atrás de um quadro de Di Cavalcanti, acima da televisão da sala, e que tanto nos divertiram. Um belo dia elas apareceram, sem mais nem menos: uma toda rosada, quase transparente; a outra com listras escuras em volta do corpo. Jorge foi logo escolhendo: 'A zebrinha é minha.' A mais bonita, pois, ficou sendo a dele. A outra, que jeito? De dona Zélia.
Recostados em nossas poltronas, após o jantar, para assistir aos noticiários de TV, vimos, pela primeira vez, as duas saírem de seu esconderijo, uma atrás da outra, direto para uma lâmpada acesa, no alto, reduto de mosquitos e de bichinhos atraídos pela luz.
— Elas agora vão jantar — disse Jorge.
Dito e feito: as duas se aproximaram docemente da claridade, estancaram a uma pequena distância da lâmpada e, imóveis, na moita, só observando. De repente, o bote fatal foi desfechado e lá se foi um dos insetos para o bucho da lagartixa de Jorge. Diante do perigo, quem era de voar voou, quem era de correr, correu, lá se foram os bichinhos, não sobrou um pra remédio, o campo ficou limpo.
Estáticas, as duas sabidas aguardaram pacientes a volta das vítimas, que, inocentes, aos poucos foram criando coragem e se chegando para, ainda uma vez, cair na boca do lobo. Ainda uma vez o lobo foi a zebrinha, que, como num passe de mágica, abocanhou um mosquito. Encantado, Jorge ria de se acabar, provocando-me: 'A tua não é de nada!' Eu protestei e ele riu mais ainda.
Brincadeira boba, inocente, passou a ser nosso divertimento durante muitas e muitas noites, muitas e muitas noites voltamos à nossa infância.
A escritora ficou viúva de Jorge Amado em 6 de agosto de 2001, quando o escritor baiano faleceu em consequência de uma parada cardiorrespiratória. Em 7 de dezembro do mesmo ano, Zélia assumiu a Cadeira nº 23 da Academia Brasileira de Letras, ocupada anteriormente pelo marido.
Entre as obras publicadas estão uma fotobiografia, um romance, livros infantis e, principalmente, livros de memórias. Veja abaixo algumas de suas obras disponíveis na Biblioteca de São Paulo.
Memorial do amor
Segundo Paloma Amado, este livro, que Zélia Gattai terminou de escrever aos 88 anos, em plena forma de sua espantosa juventude, foi inspirado na saudade, no amor, na amizade e na generosidade. Nele encontramos tudo isso elevado à sua máxima potência, contando da mesma forma simples e direta que marca sua obra.
Anarquistas, graças a Deus
A obra retrata a aventura dos imigrantes italianos em busca da terra dos sonhos e o percurso interior da pequena Zélia na capital paulista - uma menina para quem a vida, mesmo nos momentos mais adversos ou indecifráveis, nunca perdeu o encanto. A determinação de seu Ernesto e a paixão pelos automóveis, a convivência diária com os irmãos e dona Angelina, os sábios conselhos da babá Maria Negra, as idas ao cinema, ao circo e à escola, as viagens em grupo, o avanço da cidade e da política.
Nestas crônicas familiares, vida e imaginação se embaralham, tendo como pano de fundo um Brasil que se moderniza sem, contudo, perder a magia.

Crônica de uma namorada
O livro traça um painel da sociedade paulista dos anos 50 ao relatar o desabrochar sexual de uma menina. Marcado pela singeleza e pela ternura, o livro é uma pequena obra-prima da autora.

Pipistrelo das mil cores
Pipistrelo é um bicho muito curioso que foi achado no meio do mato, nos confins do Pantanal, nadando em uma lagoa azul. Infelizmente, eram três os caçadores ali à espreita e eles não perderam a chance de capturá-lo e levá-lo para a cidade, onde organizaram um leilão para tirar o melhor proveito possível de sua caça mais preciosa. Parecido com um dragão dos contos de fadas, Pipistrelo tinha asas de seda que mudavam de cor. E como não tinha voz, expressava seus sentimentos ao mudar a cor de suas asas.
Para consultar mais obras da escritora acesse o catálogo da BSP.
Vale lembrar: Continua até 22 de julho a exposição Jorge Amado e Universal no Museu da Língua Portuguesa, que faz parte das comemorações oficiais do centenário de nascimento do escritor.
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