Paulo Scott fala sobre relação entre Direito e Literatura, tema de seu curso online
Postado em 16 DE dezembro DE 2020Autor premiado de romances e livros de poesia, Paulo Scott ministrou, no fim de novembro, na programação da BSP, o curso online Direito e Literatura: a expressão dos Direitos Humanos na literatura brasileira contemporânea e sua leitura, a partir da noção de testemunho. Nas quatro aulas, o escritor gaúcho abordou a relação interdisciplinar entre Direito e Literatura, a partir da análise de trechos de narrativas de ficção.
A seguir, o autor de “Marrom e Amarelo” (São Paulo: Alfaguara, 2019), no qual aborda as perversidades do racismo e do colorismo no Brasil, explica o que é o movimento Direito e Literatura e fala sobre sua importância. Ele trabalha atualmente na pesquisa documental para escrita do romance “Rondonópolis”.
O que é o movimento "Direito e Literatura" e no que consiste?
É a leitura combinada das linguagens literária e jurídica, das narrativas que são parte desses dois universos. Nos Estados Unidos, é um movimento forte que ganhou mais espaço a partir dos anos 1980. Aqui no Brasil, as reflexões começaram a ganhar expressão nesta segunda década do século XXI.
Qual a importância do Direito na Literatura Brasileira contemporânea?
Penso que a pergunta mais apropriada seria: qual a importância da Literatura para o Direito? A narrativa literária de qualidade chega a uma verdade, a uma solução empática, a um panorama, que a dinâmica da aplicação da Justiça não alcança. Nesse sentido, o debate em torno dessa relação interdisciplinar entre os dois universos pode ser tomado como um meio de sensibilização e melhor apreensão da efetividade do Direito na sociedade.
Quais autores são mais relevantes dentro dessa tendência e por quê?
Nos Estados Unidos, há o jurista Ronald Dworkin. Sua relevância está na proposta de leitura do Direito, das narrativas formuladas nas decisões jurisdicionais, a partir de instrumentos da teoria literária. No Brasil, temos pensadores como Lenio Streck e André Karam Trindade, que vêm pensando maneiras de aproximação dessas duas realidades. Há também uma pensadora cujo trabalho me impacta bastante: a professora Maria Helena Damasceno e Silva Megale, que propõe a investigação a partir do pensamento de filósofos como Heidegger.
Os Direitos Humanos trazem na Declaração Universal dois artigos importantes sobre o direito à Educação e à Cultura. É algo que o Brasil consegue prover satisfatoriamente?
Sem dúvida, não. O Brasil não consegue sair do século XIX, nesse sentido. A afirmação dos Direitos Humanos tem necessidade de uma tensão, de uma cobrança, de uma leitura crítica que somente se viabiliza na plenitude de um modelo civilizatório em que cidadãs e cidadãos possuem (recebem) educação de qualidade. É o componente emancipatório que os governantes de todos os matizes sempre temeram.
Como a pandemia afetou o seu trabalho como escritor? O que visualiza no futuro?
Tive mais tempo para ler e refletir sobre o que li. No curto prazo, imagino que haja um espaço singular para o trabalhar e o retrabalhar das perplexidades geradas pelo processo de enfrentamento precário da pandemia no Brasil.